Crimes em S. Miguel vão aumentar com o casino



O primeiro casino do arquipélago dos Açores vai ser inaugurado em 2008. A infra-estrutura será propriedade do Grupo ASTA Atlântida - Sociedade de Turismo e Animação, a quem foi concessionada a exploração do jogo no arquipélago, e ficará localizada, junto com uma nova unidade hoteleira, no agora parque de estacionamento da Calheta de Pêro de Teive, em Ponta Delgada. Assim, o Hotel Casino Príncipe do Mónaco - denominação da unidade - terá 100 quartos e será apoiado, numa fase inicial, por uma área de jogo com 200 slot-machines. O novo casino terá ainda uma zona para jogos bancados, de entre os quais consta a famosa roleta russa, e uma sala de espectáculos para mais de 200 pessoas. Durante largos anos, a questão da abertura de um casino nos Açores esteve na ordem do dia. As opiniões de diversas franjas da sociedade dividiram-se entre aqueles que defendiam que tal seria importante para o desenvolvimento económico da Região e aqueles que alertavam - e continuam a alertar para as consequências nefastas que daí poderão advir para a sociedade. Uma das opiniões que ficou na retina foi a do então bispo dos Açores, que comparou o jogo ao vício da droga e do álcool. A verdade é que, depois de tanta discussão, o Governo Regional acabou por autorizar e concessionar o jogo nos Açores. Apesar disto, a discussão e a divisão de opiniões não terminou, havendo quem preveja que o casino poderá fazer com que a criminalidade aumente na cidade de Ponta Delgada, e mesmo na ilha de S. Miguel. O sociólogo Alberto Peixoto refere que do conhecimento que tem de outras realidades, tanto a nível nacional como internacional, "serão de prever algumas transformações do ponto de vista criminal. Ou seja, é de esperar que as estatísticas apresentem um aumento de crimes ao nível da extorsão - agressões físicas e ameaças e ainda, possivelmente, alguns sequestros. No entanto, aquela criminalidade que, a meu ver, poderá ter um crescimento muito significativo prender-se-á com os furtos de arte sacra." O sociólogo passa então a explicar qual a relação que poderá haver entre um casino e a arte sacra, dizendo que "como é do conhecimento geral, os Açores são muito ricos em arte sacra e as igrejas estão abertas, durante todo o dia, sem qualquer tipo de segurança, para além de não haverem quaisquer registos das peças que lá existem. Este espólio é agora ameaçado, sobretudo, pela questão das dívidas que poderão advir do jogo." Assim, acrescenta Alberto Peixoto, "como estas peças têm um enorme valor, algumas pessoas que venham a contrair dívidas de jogo podem ser forçadas a praticar este tipo de crime, como forma de as saldar". Desta forma, defende este estudioso dos fenómenos sociológicos, "será necessário haver um investimento muito grande na segurança destes locais, de forma a funcionar como elemento dissuasor para afastar os presumíveis interessados em roubar algumas dessas peças". Assim, será bom que, quanto antes, se acautele o património eclesiástico, de preferência numa altura em que ainda faltam sensivelmente dois anos para a abertura do casino.

Agiotas passarão a ser uma realidade
Quando as dívidas de jogo se acumulam e as entidades bancárias recusam a concessão de crédito entram em campo os denominados agiotas, pessoas com algum poderio económico que emprestam dinheiro com juros elevadíssimos. Será de esperar, de acordo com Alberto Peixoto, que "tal comece a acontecer em S. Miguel, e quanto a isto é difícil haver, antecipadamente, uma postura de combate e prevenção". A única possibilidade, segundo o sociólogo, será "alertar para os perigos do jogo e o que este pode fazer às famílias, levando mesmo algumas delas à penumbra".

Jogo é um vício muito perigoso e compulsivo
O jogo pode trazer graves consequências a uma sociedade. Esta é, pelo menos, a opinião de pessoas que já estudaram o fenómeno em profundidade.
São frequentes os estudos sobre o jogo e dos respectivos efeitos na sociedade. Alguns destes apontam mesmo para a destruição de famílias devido às dívidas acumuladas por parte dos seus membros em mesas de casino. Numa altura em que faltam sensivelmente dois anos para a abertura de um casino em S. Miguel, mais precisamente na cidade de Ponta Delgada, seria interessante aferir das consequências que daí poderão advir. Todavia, contactados diversos psicólogos que trabalham na maior ilha açoriana, a reportagem do EXPRESSO DAS NOVE não encontrou nenhum que tivesse estudado tal matéria. Como tal, as opiniões que os mesmos têm sobre este denominado vício perigoso e compulsivo - o jogo - acabam por ser equivalentes às de muitos outros cidadãos e vão no sentido de que tal prática, quando descontrolada, pode ser grave. De acordo com a busca efectuada pela nossa reportagem, a característica essencial do jogo patológico (vício) é a de um comportamento mal adaptado, recorrente e persistente, que perturba os empreendimentos pessoais, familiares e ocupacionais. Tal transtorno pode fazer com que o implicado mantenha preocupações relacionadas com o jogo, tais como planear a próxima jogada ou pensar num modo de obter dinheiro para voltar a jogar. A maioria dos indivíduos viciados no jogo afirma que está mais em busca de acção do que de dinheiro e, por causa dessa busca, apostas ou riscos cada vez maiores podem ser necessários para continuar a produzir o nível de excitação desejado. Mas, então, como poderá responder a sociedade micaelense à abertura de um casino e à constante presença do jogo? O sociólogo Alberto Peixoto refere que "esta é uma questão muito complexa de ser respondida, até porque seria necessário fazer alguma futurologia". No entanto, adianta, "é de esperar que, numa primeira fase, haja uma grande afluência de pessoas ao casino, um pouco à semelhança, aliás, do que aconteceu por altura da abertura do Parque Atlântico. A novidade vai levar a que muitas pessoas, inicialmente, ali se desloquem para jogar. Depois, gradualmente, haverá um período em que se irão fixando alguns comportamentos desviantes, aos quais se seguirão tempos de maior equilíbrio, muito também por força da intervenção que será feita, tanto pelas autoridades policiais, como pela própria Câmara Municipal de Ponta Delgada e pelo Governo Regional." Contudo, alerta Alberto Peixoto: "No período intermédio a todas estas fases, é de esperar que, nas zonas limítrofes do casino, aumente o número de crimes e de furtos, para além dos danos pessoais e materiais."

Terceira e Faial também vão jogar
Na Terceira e no Faial, apesar de não haver casino, o jogo também vai passar a fazer parte do quotidiano. Nestas ilhas funcionarão máquinas de jogo e ainda uma sala de bingo, tudo instalado no mesmo edifício que, segundo o decreto-lei que regulamenta a concessão do jogo no arquipélago, será construído de raiz para o efeito, ou será, em caso do mesmo já existir, especialmente adaptado.

Pedro Ferreira
18-08-2006